No Ciclo.
Quase trinta anos depois. Caramba. O meu Ciclo, o nosso Ciclo. O mesmo piso pisado pelas recordações que nos fazem lembrar os primeiros amigos. De taco sombrio, taciturno, contrastando com o azul memória das paredes, onde nos encostavamos esperando sempre pelo toque de feriado, mesmo que tivéssemos visto o professor três minutos antes no bar. Não importava. Aquele corredor era meu, era teu, era nosso. A luz entrava pelas mesmas janelas que ainda hoje lá subsistem, estóicas, filtrando o mínimo raio de sol no agreste inverno portalegrense, e fazendo reluzir todas as crianças num junho já com sabor a férias grandes.
Os rituais. Ser o primeiro a chegar à sala para tocar nas placas que as enumeravam. Bom saber que subsiste. Bom descobrir que a inocência permanece num mundo difícil, de influências e desafios negativos que nós não tínhamos há quase trinta anos. A corrida desenfreada, escadas abaixo, entre ralhetes das auxiliares, para ser o primeiro a chegar ao bar e conseguir ser o rei do folhado e do cachorro no intervalo grande, que durava e dura vinte minutos, mas que vale por um dia inteiro de brincadeira e gargalhada. As bolas, os elásticos, tudo está lá ainda, como se nada tivesse mudado neste recreio de tamanho desmedido, onde cabe o mundo inteiro na imaginação destes miúdos e dos outros, de há quase trinta anos.
As salas com o seu palco, onde os papéis do teatro, que é e sempre será ensinar, se alteram. No palco, aquele que quer ser entretido; nas cadeiras, de olhos ávidos de conhecimento, aqueles que são as verdadeiras estrelas deste mundo.
Trinta anos depois estou aqui. E vejo-vos a vocês também. Vai uma corrida a ver quem chega primeiro à sala?